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19 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Justiça do Paraná TJ-PR - Mandado de Segurança: MS XXXXX PR XXXXX-5 (Acórdão)

Tribunal de Justiça do Paraná
há 11 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

Órgão Especial

Publicação

Julgamento

Relator

Desembargador Rabello Filho
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Ementa

Mandado de segurança - Ex-governador do Estado do Paraná - Cassação da verba de representação prevista no artigo 85, parágrafo 5.º, da Constituição Estadual.

1. Pretensão de declaração do direito ao recebimento da verba de representação prevista no artigo 85, parágrafo 5.º, da Constituição Estadual - Suspensão do curso procedimental diante da existência concomitante de ação declaratória de inconstitucionalidade, em trâmite perante o Supremo Tribunal Federal (ADIn n.º 4.545-PR), versando sobre a (in) constitucionalidade desse direito - Decurso do prazo de suspensão previsto no artigo 265, parágrafo 5.º, do Código de Processo Civil sem que a questão prejudicial se resolvesse - Necessidade, então, de retomada do curso procedi- mental - Precedente do Superior Tribunal de Justiça.
2. Verba de representação prevista no artigo 85, parágrafo 5.º, da Constituição Estadual - Cassação por ato administrativo - Ilegalidade reconhecida por esta Corte Especial - Princípio da segurança jurídica que deve ser enaltecido no caso - Igualdade de tratamento em casos semelhantes que se impõe - Força vinculante dos precedentes - Segurança concedida, por conseguinte.
3. Curso procedimental retomado e segurança concedida. (TJPR - Órgão Especial - MSOE - 793432-5 - Curitiba - Rel.: Desembargador Rabello Filho - Por maioria - J. 03.06.2013)

Acórdão

Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Acórdão. Eventuais imagens serão suprimidas. Recomenda-se acessar o PDF assinado. MANDADO DE SEGURANÇA N.º 793432-5, DE CURITIBA RELATOR : DESEMBARGADOR Francisco Pinto RABELLO FILHO IMPETRANTE : MÁRIO PEREIRA IMPETRADO : GOVERNADOR DO ESTADO DO PARANÁ LIT. PASSIVO : ESTADO DO PARANÁ Mandado de segurança ­ Ex-governador do Estado do Para- ná ­ Cassação da verba de representação prevista no artigo 85, parágrafo 5.º, da Constituição Estadual. 1. Pretensão de declaração do direito ao recebimento da ver- ba de representação prevista no artigo 85, parágrafo 5.º, da Cons- tituição Estadual ­ Suspensão do curso procedimental diante da existência concomitante de ação declaratória de inconstitucionali- dade, em trâmite perante o Supremo Tribunal Federal (ADIn n.º 4.545-PR), versando sobre a (in) constitucionalidade desse direito ­ Decurso do prazo de suspensão previsto no artigo 265, parágrafo 5.º, do Código de Processo Civil sem que a questão prejudicial se resolvesse ­ Necessidade, então, de retomada do curso procedi- mental ­ Precedente do Superior Tribunal de Justiça. 2. Verba de representação prevista no artigo 85, parágrafo 5.º, da Constituição Estadual ­ Cassação por ato administrativo ­ Ilegalidade reconhecida por esta Corte Especial ­ Princípio da se- gurança jurídica que deve ser enaltecido no caso ­ Igualdade de tratamento em casos semelhantes que se impõe ­ Força vinculante dos precedentes ­ Segurança concedida, por conseguinte. 3. Curso procedimental retomado e segurança concedida. Vistos, relatados e discutidos estes autos de mandado de segurança n.º 793432-5, de Curitiba, em que é impetrante Mário Pereira, impetrado Governa- dor do Estado do Paraná e litisconsorte passivo, Estado do Paraná. Exposição 1. Mário Pereira impetra o presente mandado de segurança contra ato do Governador do Estado do Paraná, consistente, dito ato, entre outras coisas, em invalidar a concessão da verba de representação aos ex-governadores do Es- tado do Paraná, que titularizaram o cargo posteriormente a 5 de outubro de 1988, incluído aí o impetrante. 1.1. Sustenta o impetrante, em resumo: i) é titular de direito líquido e certo ao recebimento da verba de representação, pre- vista no artigo 85, parágrafo 5.º, da Constituição do Estado do Parana, pelo exercício do cargo de governador do Estado do Paraná, no período compreendido entre abril e dezembro de 1994; ii) após findo o exercício de seu mandato, requereu a concessão da verba de repre- sentação, que passou a ser paga em fevereiro de 1995; iii) em março de 2011 foi surpreendido com o recebimento de notificação para que se manifestasse acerca da cassação da verba de representação, em virtude da atribuição de caráter normativo ao Parecer n.º 26/2011-PGE, ante sua suposta inconstitucionalidade (da verba de representação); iv) sem a instauração de prévio processo administrativo, a autoridade coatora deter- minou à Secretaria de Estado da Administração que tomasse providências para cassar as verbas de representação concedidas aos ex-governadores do Estado do Paraná, que titulari- zaram o cargo após a promulgação da Constituição Federal de 1988; v) após a apresentação de sua manifestação ­ onde arguiu a nulidade do ato adminis- trativo, a ocorrência de decadência e prescrição, a incompetência da autoridade coatora para declarar a inconstitucionalidade da Constituição do Estado do Parana e a constitucionalida- de da previsão do artigo 85, parágrafo 5.º, da Constituição Estadual ­, a Procuradoria Geral do Estado elaborou a Informação n.º 110/2011-AT/PGE, refutando integralmente os argu- mentos lançados; vi) ato contínuo, a autoridade coatora invalidou a concessão da verba de representa- ção aos ex-governadores do Estado do Paraná, que titularizaram o cargo posteriormente a 5 de outubro de 1988, sem necessidade de restituição ao erário dos valores já recebidos; vii) o processo que resultou na cassação da verba de representação é nulo, porquanto somente foi instaurado após ato unilateral de atribuição de caráter normativo ao Parecer n.º 26/2011-PGE, que determinava a cassação do pagamento da aludida verba, em grave ofen- sa aos princípios da ampla defesa e do contraditório; viii) a Administração Pública decaiu do direito de anular o ato concessivo da verba de representação, cujo prazo decadencial, nos termos do artigo 54 da Lei n.º 9.784/1999, é de 5 anos; ix) o prazo decadencial quinquenal é aplicado inclusive quanto a atos que produzam efeitos patrimoniais contínuos, inexistindo, ainda, qualquer discriminação, no mencionado artigo 54, quanto ao tipo de vício do ato jurídico que se pretenda anular; x) a invalidação da concessão da verba de representação violou direito adquirido seu, além de caracterizar violação ao princípio da segurança jurídica; xi) também está atingida pela prescrição quinquenal a possibilidade de anulação do ato administrativo de concessão da verba de representação, nos termos do Decreto n.º 20.910/1932 e da Lei n.º 4.717/1965; xii) deve ser concedida liminar para suspender os efeitos do ato coator, determinan- do-se o imediato depósito da verba de representação do mês de maio de 2011 e o restabele- cimento quanto aos meses susbsequentes. 1.2. Postergada a análise da liminar (fs. 382-383), o impetrado prestou informações, juntamente com o litisconsorte passivo (fs. 390-402): i) os fundamentos expostos no presente mandamus também foram os aduzidos no processo administrativo que culminou na cassação da verba de representação devida ao im- petrante; ii) naquele procedimento, todos os argumentos foram analisados pela Procuradoria Geral do Estado, previamente à decisão proferida pelo chefe do Poder Executivo; iii) o princípio da segurança jurídica somente impede que a modificação da interpre- tação das normas jurídicas pela Administração Pública tenha efeitos retroativos; iv) não há falar em ocorrência de prescrição, já que a regra do artigo 21 da Lei n.º 4.717/1965 tem incidência apenas no âmbito da ação popular, e não quanto ao poder-dever da Administração, de anulação de seus próprios atos; v) tampouco está caracterizada a decadência, porquanto a Lei n.º 9.784/1999 regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, não se aplicando aos demais entes públicos; vi) o ato administrativo maculado pelo vício da inconstitucionalidade não pode ser convalidado, não havendo falar em prazo decadencial ou prescricional para a constatação dessa nulidade; vii) faz expressa remissão às demais razões expostas na Informação n.º 110/2011- AT/PGE, quanto aos outros argumentos abordados na defesa oferecida no processo admi- nistrativo; viii) não estão presentes os requisitos para a concessão da liminar postulada. 1.3. O Ministério Público, representado pelo digno subprocurador- geral de justiça Lineu Walter Kirchner, opinou pela concessão da liminar postu- lada e posterior suspensão do curso do processo, nos termos do artigo 265, inciso IV, alínea a, do Código de Processo Civil, até o julgamento definitivo da ADIn n.º 4.545-PR, pelo Supremo Tribunal Federal (fs. 414-422). 1.4. Esta Corte Especial, então, por maioria de votos indeferiu a limi- nar postulada e determinou a suspensão do curso do processo, até o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, da ADIn n.º 4.545-PR, nos termos do artigo 265, inciso IV, alínea a, do Código de Processo Civil (fs. 452-473) 1.5. Opostos embargos de declaração pelo impetrante (fs. 482- 484), foram eles rejeitados (fs. 491-497). 1.6. Com o transcurso do prazo previsto no artigo 265, parágrafo 5.º, do Código de Processo Civil, sem o julgamento da ADIn n.º 4.545-PR, vieram- me conclusos os autos. Voto 2. O impetrante exerceu o cargo de governador do Estado do Paraná, no período compreendido entre abril e dezembro de 1994, e em seguida requereu a concessão da verba de representação, prevista no artigo 85, parágrafo 5.º, da Constituição do Estado do Parana, o que foi deferido e implementado a partir de fevereiro de 1995. 2. 1. Com a atribuição de caráter normativo ao Parecer n.º 26/2011- PGE (f. 96), elaborado quando da requisição, pelo Supremo Tribunal Federal, de informações ao governador do Estado na ADin n.º 4.545-PR, os ex-governadores que estavam recebendo a verba de representação foram notificados para se mani- festarem acerca da cassação da verba de representação, ante sua inconstituciona- lidade (f. 101). 2.2. Após a manifestação do impetrante (fs. 240-260), a Procuradoria Geral do Estado elaborou a Informação n.º 110/2011-AT/PGE (fs. 334-371), opi- nando pela manutenção da cassação da verba de representação. 2.3. Encaminhados os autos do processo administrativo n.º 10.880.349-51 ao governador do Estado do Paraná, foram invalidados os atos concessivos do pagamento da verba de representação aos ex-governadores do Estado do Paraná, que titularizaram o cargo posteriormente a 5 de outubro de 1988, sem necessidade de restituição ao erário dos valores já recebidos (fs. 373- 374). 2.4. Inconformado, o ex-governador Mário Pereira impetrou o presen- te mandado de segurança, visando à cassação do ato administrativo que invalidou a concessão da verba de representação, ante sua flagrante ilegalidade, com a de- claração de seu direito ao recebimento da aludida verba. 3. Após a apresentação de informações (fs. 390-402) e colhida a opi- nião do Ministério Público (fs. 414-422), o curso procedimental ficou paralisado diante da existência de questão prejudicial, porquanto tramita perante o Supremo Tribunal Federal a ação direta de inconstitucionalidade (ADIn) n.º 4.545-PR, em que se discute a constitucionalidade de tal verba de representação, prevista no artigo 85, parágrafo 5.º, da Constituição Estadual (fs. 452-473). 3.1. Com o decurso do prazo de suspensão do curso procedimental outrora determinado sem que a questão prejudicial que a motivou tenha se resol- vido, o presente mandamus não pode ficar aguardando indefinidamente uma res- 1 Também foram remetidos, conjuntamente, os processos administrativos n.º 10.925.595-5, 10.880.347-9 e 10.880.408-4, relativos aos demais ex-governadores atingidos pela atribuição de caráter normativo ao Parecer n.º 26/2011-PGE. posta jurisdicional, a teor do que determina o artigo 265, parágrafo 5.º, do Códi- go de Processo Civil. 3.2. A propósito, o Superior Tribunal de Justiça tem reiteradamente enfatizado a necessidade de observância do prazo máximo de suspensão de 1 ano havendo pendente questão prejudicial que obstaculize o julgamento, quando, en- tão, a certeza cede passo à celeridade processual, v.g.: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA QUE ENSEJA REEXAME DE PROVA. SÚMULA 07/STJ. SUSPENSÃO DO PROCESSO. PEN- DÊNCIA DE JULGAMENTO DE AÇÃO NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ( ADI N. 2.440) SOBRE O TARE - TERMO DE ACORDO DE REGIME ESPECIAL FIRMADO PELO GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL E CONTRIBUINTE. ART. 265, IV, A, E § 5º DO CPC. DECURSO DO PRAZO DE UM ANO. RETOR- NO DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM. 1. Recurso especial interposto em face de acórdão que não manteve a suspensão do processo até o julgamento da ADI n. 2.440, em que se discute a respeito da legalidade do TARE, por entender ser aplicável o prazo máximo de 01 (um) ano, nos termos do art. 265, IV, a e § 5º do CPC. 2. Ao STJ compete "velar pela exata aplicação do direito aos fatos que as instâncias ordinárias soberanamente examinaram" ( AgRg no AG nº 3742/RJ). Tendo o Tribunal re- corrido verificado que a suspensão sine die do feito pode causar dano ao agravante por não se ter uma previsão de quando o provimento jurisdicional buscado poderá ser obtido, nesta Corte Superior o exame de tais fatos encontra óbice na sua Súmula n. 07. 3. Ultrapassado o prazo legal de 01 (um) ano, o valor celeridade passa a superar o valor certeza e autoriza o juiz a apreciar a questão prejudicial o quanto suficiente (inciden- ter tantum) para fundamentar a decisão, não se revestindo, essa análise, da força da coisa julgada material (art. 469, III do CPC). 4. A suspensão do feito foi determinada por decisão interlocutória, proferida pelo ju- ízo de primeiro grau, publicada no DJ de 13.03.2006, já se encontrando esgotado o prazo de um ano estabelecido pelo § 5º do art. 265 do CPC, bastando, por esse motivo, ter prosse- guimento o julgamento da ação civil pública. 5. Precedentes: REsp XXXXX/DF, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 23/04/2007; REsp XXXXX/DF, Rel. Min. José Delgado, DJ 16/10/2006. 6. Recurso especial não-provido.2 3.3. Logo, a análise das questões trazidas no mandado de segurança é medida que se impõe, com o que, aliás, se estará dando eficacidade ao princípio da duração razoável do processo ( CF, art. 5.º, inc. LXXVIII). É o que passo a fazer. 4. Cinge-se a controvérsia em averiguar a regularidade, ou não, do ato administrativo que invalidou a concessão da verba de representação ao impetran- te. 4.1. Quanto a isso, não há protelar: o Órgão Especial desta Corte, em sessão realizada no dia 20 de maio de 2013, ao apreciar o mandado de segurança XXXXX-5, impetrado pelo ex-governador Orlando Pessuti, reconheceu a ilegali- dade do mesmo ato administrativo aqui impugnado, cujo acórdão, ainda penden- te de publicação, restou assim ementado: MANDADO DE SEGURANÇA. EX-GOVERNADOR DO ESTADO DO PARA- NÁ. VERBA DE REPRESENTAÇÃO PREVISTA NO § 5.º ART. 85 DA CONSTITUI- ÇÃO ESTADUAL. ALEGAÇÃO DE QUE NÃO PODERIA TER OCORRIDO SUA CASSAÇÃO POR DECISÃO ADMINISTRATIVA. LIMINAR INDEFERIDA. PRELI- MINAR DE SUSPENSÃO DO PROCESSO NO AGUARDO DO JULGAMENTO, PELO 2 STJ, 1.ª Turma, REsp XXXXX-DF, unânime, rel. min. José Delgado, j. 12/2/2008, in DJe 10/3/2008 ­ os destaques em negrito e itálico são do original. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, DA ADI N.º 4.545/PR. REJEIÇÃO. CONCESSÃO, PELO MÉRITO, DA ORDEM. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALI- DADE EM VISTA DAS CIRCUNSTÂNCIAS, NESTE ESPECÍFICO MOMENTO, DO CASO CONCRETO. (1) É possível ao Chefe do Executivo deixar de cumprir leis que repute inconstitu- cionais, desde que acione o controle abstrato de constitucionalidade ou solicite que o fa- ça quem detém legitimidade para tanto. Esse, sem sombra de dúvida, o melhor procedi- mento a ser adotado em casos como o presente para evitar juízos equivocados de consti- tucionalidade, pois se harmoniza com o dever de coerência e lealdade que deve ter o Che- fe do Executivo com a Constituição, quer em razão da necessidade de se excluir do orde- namento jurídico as leis inconstitucionais, quer em razão do monopólio do Poder Judiciário para proferir a última palavra acerca da consti- tucionalidade das leis. (2) Diante da presunção de constitucionalidade ( CF, arts. 2.º e 97) da norma im- pugnada na ADI n.º 4.545/PR., até o presente momento não desconstituída pela Suprema Corte mediante concessão de tutela de urgência tendente a suspender seus efeitos, devem prevalecer, em juízo de proporcionalidade, os princípios constitucionais do direito à vida ( CF, art. 5.º,"caput") e da dignidade pessoa humana ( CF, art. 1.º, inciso III), haja vista a natureza alimentar da verba de representação que vinha percebendo o impetrante, em detrimento, neste específico momento, dos princípios entendidos como violados em casos como o presente, ou seja, do equilíbrio federativo, da igualdade, da impessoalidade e do controle dos gastos públicos. (3) é que, segundo a doutrina de Eduardo Talamini a propósito do princípio da proporcionalidade, "quando dois ou mais princípios colidem, deverão ser ponderados e balanceados, considerando-se o peso que cada um deles tem, em vista das circunstâncias concretas. Um cederá perante o outro, na medida do necessário, naquele caso. Mas isso não significará declarar inválido o princípio que não prevaleceu, nem lhe introduzir uma cláusula de exceção. Apenas, naquelas específicas circunstâncias, um dos princípios pre- cede ao outro ­ podendo ser diversa a ordem de precedência em outras circunstâncias" (Tutela de urgência contra a Fazenda Pública, Caderno de Direito Processual Civil 2009, Escola da Magistratura do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, in http://www2.trf4.jus.br/trf4/upload/editor/rlp_EDUARDO_TALAMINI.pdf). 4.2. Com isso, como juiz de órgão colegiado, preciso colocar em pla- no secundário minha convicção pessoal, o que tenho o dever institucional de fa- zer em prol da uniformização da jurisprudência, com o que estou contribuindo para a unicidade do Direito e principalmente prestigiando o próprio princípio da segurança jurídica. Esse sobreprincípio é verdadeiro esteio do Estado Democrá- tico de Direito, com uma básica formulação de exigência: previsibilidade da ação estatal3, já agora no que diz respeito às decisões judiciais. 4.3. O professor Canotilho4, a propósito, reconhece que "Sob o ponto de vista do cidadão, não existe um direito à manutenção da jurisprudência dos tribunais, mas sempre se coloca a questão de saber se e como a proteção da con- fiança pode estar condicionada pela uniformidade, ou, pelo menos, estabilidade, na orientação dos tribunais". 4.4. Seja nos sistemas de civil law, como nos de common law, o obje- tivo primordial do Direito é proporcionar estabilidade e previsibilidade: segu- rança jurídica, por conseguinte. 4.5. O cidadão tem o direito de não ser surpreendido com uma decisão que razoavelmente nunca poderia ter sido imaginada antes. Isso é segurança ju- rídica. Isso é estabilidade. Isso é previsibilidade da ação do Estado-jurisdição. 3 RABELLO FILHO, Francisco Pinto. O princípio da anterioridade da lei tributária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, pp. 100 e segs. 4 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 2002, p. 265 ­ no original não há o destaque em itálico. 4.6. Raoul Van Caenegem5, Professor Emérito da Universidade de Ghent (Bélgica), um dos mais famosos historiadores do Direito, arrolando oito critérios do que ele chama de "bom sistema jurídico" ("good law"), põe entre eles a necessidade de um sistema jurídico "compreensível e cognoscível" ("com- prehensible and cognoscible law"). 4.6.1. Quanto a esse critério-necessidade, adverte o professor: "As pessoas não são, ou não deveriam ser ­ para usar a imagem conhecida de Ben- tham ­ como cães, que só descobrem que algo é proibido, quando a vara bate nos seus narizes". 4.7. As nações de common law têm demonstrado, com sobejo, que a cultura de observância dos precedentes é fórmula infalível para se alcançar esta- bilidade, previsibilidade, igualdade: segurança jurídica, portanto. 4.8. Parece induvidoso que já passou da hora, no Brasil, de se alcançar uma cultura de respeito aos precedentes. Precisamos, todos, profissionais do Di- reito, deixar de fugir desta verdade: enquanto a norma jurídica positivada for in- terpretada e aplicada de modo diferente para casos semelhantes, enquanto o ma- gistrado ­ a pretexto do hoje insustentável julgo conforme minha consciência ­ mantiver-se ensimesmado, sem estimar os impactos econômicos e sociais das 5 CAENEGEM, Raoul Charles Van. Judges, legislators and professors: chapters in european legal history. Cambridge University Press, 2002, p. 161 ­ tradução livre. No original: "People are not, or should not be ­ to use Bentham's well known image ­ like dogs who only discover that something is forbidden when the stick hits their noses". decisões judiciais6, certamente não se poderá falar na existência de segurança no âmbito da jurisdição. 4.9. É de Rawls7 a advertência de que "O princípio do domínio da lei implica o preceito de que as situações semelhantes devem ser tratadas de modo semelhante". Significa, então, que os poderes públicos em geral, e os tribunais em especial, devem ter a preocupação permanente de aplicar as leis com constân- cia, em ordem a tratar casos similares com similaridade. 4.10. E é pela via da vinculação aos precedentes que se alcança a al- mejada igualdade de tratamento de casos semelhantes. São de professor Marino- ni8 estas precisas e contundentes palavras: Embora as decisões, no sistema do civil law, variem constantemente de sinal, tro- cando de sentido ao sabor do vento, isto deve ser visto como uma patologia ou como um equívoco que, lamentavelmente, arraigou-se em nossa tradição jurídica. Supôs-se que os juízes não devem qualquer respeito às decisões passadas, chegando- se a alegar que qualquer tentativa de vincular o juiz ao passado interferiria sobre o seu livre convencimento e sobre a sua liberdade de julgar. Trata-se de grosseiro mal entendido, decorrente da falta de compreensão de que a decisão é o resultado de um sistema e não algo construído de forma individualizada por um sujeito que pode fazer valer a sua vontade sobre todos que o rodeiam, e, assim, sobre o pró- prio sistema de que faz parte. Imaginar que o juiz tem o direito de julgar sem se submeter às suas próprias decisões e às dos tribunais superiores é não enxergar que o magistrado é uma 6 A respeito, q. cfr. seminal estudo de LEAL, Rogério Gesta. Impactos econômicos e sociais das decisões judiciais: aspectos intro- dutórios. Brasília: Enfam, 2010. 7 RAWLS, John. Uma teoria da justiça [A theory of justice]. Trad. de Carlos Pinto Correia. Lisboa: Editorial Presença, 1993, p. 193. 8 MARINONI, Luiz Guilherme. "Aproximação crítica entre as jurisdições de civil law e common law e a necessidade de respeito aos precedentes no Brasil". In: Revista de processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 34, n. 172, jun. 2009, pp. 175-232 [206-207]. peça no sistema de distribuição de justiça, e, mais do que isto, que este sistema não serve a ele, porém ao povo. Como é óbvio, o juiz ou o tribunal não decidem para si, mas para o jurisdicionado. Por isto, pouco deve importar, para o sistema, se o juiz tem posição pessoal, acerca de ques- tão de direito, que difere da dos tribunais que lhe são superiores. O que realmente deve ter significado é a contradição de o juiz decidir questões iguais de forma diferente ou decidir de forma distinta da do tribunal que lhe é superior. [...]. É chegado o momento de se colocar ponto final no cansativo discurso de que o juiz tem a liberdade ferida quando obrigado a decidir de acordo com os tribunais superiores. O juiz, além de liberdade para julgar, tem dever para com o Poder de que faz parte e para com o cidadão. Possui o dever de manter a coerência e zelar pela respeitabilidade e pela credibi- lidade do Poder Judiciário. 4.11. Não há como negar, por conseguinte, que o respeito aos prece- dentes é forma indiscutivelmente eficaz para se alcançar segurança jurídica, com previsibilidade da ação do Estado-jurisdição. É, como tem enfatizado elogiavel- mente o professor Marinoni9, um instrumento capaz de garantir a igualdade dian- te das decisões. 4.12. Isso, penso, é forma de realizar a isonomia material, a igualdade na lei, exigência que não é dirigida somente àqueles que criam as normas jurídi- cas gerais, senão que também é um imperativo para aqueles encarregados de aplicar as normas jurídicas gerais nos julgamentos dos litígios. 4.13. Coerente com essas ideias, aqui mal e parcamente resumidas, que hão de permear as decisões do Poder Jurisdicional do Estado brasileiro, é que 9 MARINONI, Luiz Guilherme. "Aproximação crítica entre as jurisdições de civil law e common law e a necessidade de respeito aos precedentes no Brasil", cit., p. 206. me vejo na contingência de me curvar ao entendimento majoritário consagrado por este Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial. 5. Passando-se as coisas dessa maneira, meu voto é no sentido de que se retome o curso procedimental e no mérito se conceda a segurança, a fim de determinar-se o restabelecimento ao impetrante do pagamento da verba de repre- sentação. Com isso, pagará o Estado do Paraná as despesas do processo, sem ho- norários advocatícios ( LMS, art. 25). Decisão 6. À face do exposto, ACORDAM os integrantes do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por maioria de votos, em retomar o curso procedimental e conceder a segurança, nos termos do voto do relator, ven- cidos os Senhores Desembargadores Hamilton Mussi Correa (com declaração de voto), Sérgio Arenhart, Dulce Maria Cecconi, Ruy Cunha Sobrinha e Maria José de Toledo Marcondes Teixeira. 6.1. O julgamento foi presidido pelo Desembargador Clayton Camar- go, sem voto, e dele participaram, além do signatário (relator), os Senhores De- sembargadores Regina Afonso Portes, Carvílio da Silveira Filho, Sérgio Are- nhart, Dulce Maria Cecconi, Miguel Pessoa, Ruy Cunha Sobrinho, Lauro Augus- to Fabrício de Mello, Abraham Lincoln Calixto, D'Artagnan Serpa Sá, Eduardo Fagundes, Marques Cury, Maria José de Toledo Marcondes Teixeira, Paulo Ha- bith, Paulo Roberto Vasconcelos, Eugênio Achille Grandinetti, Luis Carlos Xa- vier, José Augusto Gomes Aniceto, Astrid Maranhão de Carvalho Ruthes, Hamil- ton Mussi Correa, Denise Kruger Pereira, Macedo Pacheco e Dimas Ortêncio de Melo. Curitiba, 3 de junho de 2013 (data do julgamento). Desembargador Rabello Filho RELATOR Desembargador Hamilton Mussi Correa VENCIDO
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