Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
18 de Maio de 2024
  • 2º Grau
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Tribunal de Justiça do Paraná TJ-PR - Apelação: APL XXXXX PR XXXXX-1 (Acórdão)

Tribunal de Justiça do Paraná
há 9 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

9ª Câmara Cível

Publicação

Julgamento

Relator

Domingos José Perfetto

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-PR_APL_13356291_f667c.rtf
Inteiro TeorTJ-PR_APL_13356291_96924.pdf
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Ementa

DECISÃO: ACORDAM os Desembargadores que integram a Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto. EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, EM RAZÃO DE ACIDENTE ECOLÓGICO - EXPLOSÃO DO NAVIO TANQUE VICUÑA - VAZAMENTO DE COMBUSTÍVEL (ÓLEOS E METANOL) NAS ÁGUAS DA BAÍA DE PARANAGUÁ - RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR DANOS AMBIENTAIS - TEORIA DO RISCO INTEGRAL -FATORES DE RISCO PARA A CAUSA DO ACIDENTE DECORRENTES DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS PELA PROPRIETÁRIA DA EMBARCAÇÃO E EMPRESA RESPONSÁVEL PELO TERMINAL DE DESEMBARQUE DA MERCADORIA - INEXISTÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A CONDUTA DAS APELADAS E OS DANOS SOFRIDOS - O ATO DE TEREM ADQUIRIDO O PRODUTO TRANSPORTADO PELA EMBARCAÇÃO, POR SI SÓ, NÃO CARACTERIZA O LIAME DE CAUSALIDADE - EXPLOSÃO PRÉVIA À ENTREGA DAS MERCADORIAS - REQUISITOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL NÃO PREENCHIDOS - LIAME DE CAUSALIDADE - PRESSUPOSTO INDISPENSÁVEL, MESMO EM SE TRATANDO DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR DANO AMBIENTAL - PRECEDENTES - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO."O nexo de causalidade é elemento indispensável em qualquer espécie de responsabilidade civil. Pode haver responsabilidade sem culpa como ocorre na responsabilidade objetiva, mas não pode haver responsabilidade sem nexo causal (...)."(TJPR - 8ª C.Cível - AC XXXXX-8 - Maringá - Rel.: Luis Espíndola - Unânime - J. 18.10.2007) (TJPR - 9ª C.Cível - AC - 1335629-1 - Antonina - Rel.: Domingos José Perfetto - Unânime - - J. 05.03.2015)

Acórdão

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.335.629-1, DA VARA CÍVEL, DA FAZENDA PÚBLICA, ACIDENTES DO TRABALHO, REGISTROS PÚBLICOS E CORREGEDORIA DO FORO EXTRAJUDICIAL, JUIZADO ESPECIAL CÍVEL E JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA, DA COMARCA DE ANTONINA APELANTE: LAURO BERNARDO APELADOS: GPC QUÍMICA S/A, ARAUCO DO BRASIL S/A E MOMENTIVE QUÍMICA DO BRASIL LTDA. RELATOR: DES. DOMINGOS JOSÉ PERFETTO AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, EM RAZÃO DE ACIDENTE ECOLÓGICO ­ EXPLOSÃO DO NAVIO TANQUE VICUÑA ­ VAZAMENTO DE COMBUSTÍVEL (ÓLEOS E METANOL) NAS ÁGUAS DA BAÍA DE PARANAGUÁ ­ RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR DANOS AMBIENTAIS ­ TEORIA DO RISCO INTEGRAL ­FATORES DE RISCO PARA A CAUSA DO ACIDENTE DECORRENTES DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS PELA PROPRIETÁRIA DA EMBARCAÇÃO E EMPRESA RESPONSÁVEL PELO TERMINAL DE DESEMBARQUE DA MERCADORIA - INEXISTÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A CONDUTA DAS APELADAS E OS DANOS SOFRIDOS ­ O ATO DE TEREM ADQUIRIDO O PRODUTO TRANSPORTADO PELA EMBARCAÇÃO, POR SI SÓ, NÃO CARACTERIZA O LIAME DE CAUSALIDADE ­ EXPLOSÃO PRÉVIA À ENTREGA DAS MERCADORIAS ­ REQUISITOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL NÃO PREENCHIDOS ­ LIAME DE CAUSALIDADE ­ PRESSUPOSTO INDISPENSÁVEL, MESMO EM SE TRATANDO DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR DANO AMBIENTAL ­ PRECEDENTES ­ IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO ­ SENTENÇA MANTIDA ­ RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. "O nexo de causalidade é elemento indispensável em qualquer espécie de responsabilidade civil. Pode haver responsabilidade sem culpa como ocorre na responsabilidade objetiva, mas não pode haver responsabilidade sem nexo causal (...)."(TJPR - 8ª C.Cível - AC XXXXX-8 - Maringá - Rel.: Luis Espíndola - Unânime - J. 18.10.2007) VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1.335.629-1 da Vara Cível, da Fazenda Pública, Acidentes do Trabalho, Registros Públicos e Corregedoria do Foro Extrajudicial, Juizado Especial Cível e Juizado Especial da Fazenda Pública, da Comarca de Antonina, em que é apelante Lauro Bernardo e apelados GPC Química S/A, Arauco do Brasil S/A e Momentive Química do Brasil Ltda. Lauro Bernardo ajuizou a presente ação de indenização em face de Borden Química Indústria e Comércio Ltda., Dynea Brasil S/A e Synteko Produtos Químicos S/A, em razão da explosão do navio tanque Vicuña, no píer da empresa Cattalini Terminais Marítimos, que gerou o derramamento de grande quantidade de combustíveis (óleos e metanol) nas águas da baía de Paranaguá, prejudicando a atividade pesqueira desenvolvida na região e ocasionando ao autor grande aflição diante da impossibilidade do trabalho e do sustento. Devidamente citadas, as requeridas apresentaram contestação. Momentive Química do Brasil Ltda. (atual denominação de Borden Química e Hexion Química Indústria e Comércio Ltda), aduziu a inépcia da inicial; a inexistência de nexo de causalidade entre os danos narrados e qualquer conduta sua; a necessidade de que seja identificado o agente poluidor e a inexistência dos danos morais. (fls. 20/47) Arauco do Brasil S/A (Dynea do Brasil S/A), sustentou ilegitimidades ativa e passiva; inépcia da inicial; a necessidade de chamamento ao processo/denunciação à lide das demais empresas e entidades vinculadas ao acidente; que o IBAMA e a Capitania dos Portos devem integrar a lide, com a consequente remessa dos autos à Justiça Federal; a necessária suspensão do feito até o julgamento da Ação Civil Pública n. 2005.70.08.000973; a ausência de responsabilidade da ré e de nexo de causalidade; que consoante laudo técnico do acidente elaborado pelo IBAMA e IAP as condutas danosas foram das pessoas responsáveis pelo agravamento dos impactos ambientais, todas relacionadas ao despreparo, à negligência e ineficiência dos operadores e autoridades portuárias; a inaplicabilidade da responsabilidade objetiva com base na Teoria do Risco Integral; a responsabilidade compete às empresas e entidades obrigadas pelas atividades de contensão do acidente; a inexistência de solidariedade entre as corrés; a não configuração de danos morais. (fls. 228/265) GPC Química (atual denominação de Synteko Produtos Químicos S/A) alegou a conexão da ação com aquelas que tramitam no juízo de Paranaguá e têm como objeto o mesmo evento danoso (poluição das águas da baía, em virtude da explosão do navio Vicuña); carência de ação; ilegitimidades ativa e passiva; a ausência de responsabilidade solidária; a não demonstração de qualquer conduta imputável à ré; a denunciação à lide do armador e do terminal marítimo (Sociedad Naviera Ultragas Ltda. e Cattalini Terminais Marítimos Ltda.); a necessária suspensão do processo até a decisão do Tribunal Marítimo acerca das causas do acidente; a existência de transação entre a parte autora e a empresa Sociedad Naviera Ultragas Ltda., envolvendo o mesmo objeto da presente lide; a ausência de prova quanto ao efetivo exercício da pesca no período e local afetados pela proibição da atividade; a não configuração dos requisitos da responsabilidade civil; a inexistência de qualquer relação de causa e efeito entre a atividade da GPC Química S/A e o dano verificado; a tripulação a bordo do NT Vicuña era imperita para levar a cabo e para fiscalizar a operação de descarregamento de metanol, o que se traduz em culpa da armadora/proprietária do navio; que a empresa Cattalini agiu com culpa concorrente, na medida em que os equipamentos utilizados para o descarregamento da mercadoria apresentavam defeitos; a inocorrência de danos morais (fls. 499/549). Impugnação às contestações às fls. 720/738. Sobreveio a sentença de fls. 1211/1214, que afastou as preliminares de ilegitimidades ativa e passiva, inépcia da inicial, ausência de causa de pedir, chamamento ao processo e denunciação à lide, necessidade de encaminhamento do feito à Justiça Federal, conexão, falta de interesse processual e suspensão do processo e, no mérito, julgou improcedente o pedido, na forma do artigo 267, inciso I, do Código de Processo Civil, ao entendimento de rompimento do nexo de causalidade, uma vez que as rés não concorreram para a ocorrência da explosão do navio Vicuña. Diante da sucumbência, a parte autora foi condenada ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios fixados em R$ 2.000,00 (dois mil reais), observado o disposto no artigo 12, da Lei 1.060/50. Inconformada, a parte autora interpôs apelação (fls. XXXXX), aduzindo, em suma, que: a) em razão do dano ambiental, a parte apelante foi privada do exercício de sua atividade laboral, ficando sem poder prover o sustento de sua família durante meses; b) aplica-se ao caso a responsabilidade objetiva, fundada na Teoria do Risco Integral; c) é irrelevante a perquirição de culpa ou dolo; d) as atividades exercidas pelas apeladas, ainda que indiretamente, criam um risco especial para terceiros, o que implica em ressarcimento pelos danos causados; e) as apeladas eram as proprietárias da carga que vazou após a explosão do navio e, assim, devem responder solidariamente, porque fazem parte de uma cadeia produtiva e, em determinado momento, auferem lucro; f) a contaminação do ambiente ocorreu devido ao derramamento nas águas dos produtos químicos de propriedade das apeladas, sendo este o nexo de causalidade entre as atividades por elas desenvolvidas e os danos narrados; g) deve ser observado o princípio do poluidor-pagador; h) pela Teoria do Risco da Atividade, o empreendedor responde por quaisquer danos que seus produtos ou serviços causarem; i) a Lei n. 12.305/10 prevê a responsabilidade solidária e integral do poluidor, com relação aos resíduos sólidos, assim considerados também os líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d'água; j) ainda, deve ser aplicada a Teoria da Responsabilidade pelo Fato do Produto e do Serviço, insculpida no Código de Defesa do Consumidor; k) na espécie, a lesão moral decorrente do dano ambiental é presumida (in re ipsa), não dependendo de comprovação; l) deve ser arbitrada em favor do apelante indenização por danos morais em valor não inferior a 100 (cem) salários mínimos; m) diante da procedência do pedido, é de ser invertido o ônus de sucumbência; n) em não sendo este o entendimento desta Corte, alternativamente, a sentença comporta anulação, para que o recorrente possa comprovar, por todos os meios de prova admitidos, o dano extrapatrimonial sofrido. Contrarrazões pelas apeladas GPC Química às fls. 1465/1487, Arauco do Brasil às fls. 1489/1515 e Momentive Química do Brasil às fls. 1246/1275. É o relatório. Presentes os requisitos de admissibilidade, forçoso o conhecimento do recurso. É fato notório a ocorrência do acidente com o navio Vicuña, de propriedade da empresa Sociedade Naviera Ultragás Ltda., que explodiu no porto de Paranaguá, em 15/11/2004, enquanto operava no terminal da empresa Cattalini Terminais Marítimos Ltda., despejando a carga transportada ­ óleos combustíveis e metanol ­ na baía de Paranaguá, o que prejudicou a atividade pesqueira desenvolvida na região. Voltando-se contra a sentença que entendeu pela inexistência do nexo de causalidade entre qualquer conduta das apeladas ­ por não terem concorrido para a ocorrência da explosão da embarcação ­ e os danos experimentados, alegou a parte apelante o dever de indenizar em razão da aplicação, à espécie, da responsabilidade objetiva embasada na Teoria do Risco Integral, sendo, pois, irrelevante, a perquirição de culpa ou dolo. Defendeu, ainda, que as apeladas eram as proprietárias da carga, devendo responder pelos riscos decorrentes das atividades que exercem, já que fazem parte de uma cadeia produtiva, por meio da qual auferem lucro. Bem que os danos morais, no caso, configuram- se in re ipsa, ou seja, são presumidos em razão da própria conduta potencialmente lesiva. Em resumo, sustentou a presença dos requisitos ensejadores do dever de indenizar, em especial do liame de causalidade afastado pela sentença recorrida. A controvérsia tem seu cerne, portanto, na apuração da eventual responsabilidade das apeladas pela explosão do navio Vicuña e consequente derramamento de agentes poluentes nas águas da baía de Paranaguá, o que impediu por aproximadamente 60 (sessenta dias) a atividade pesqueira desenvolvida pela parte apelante. Impende lembrar, que em havendo dano ambiental, no qual se discute a existência do desenvolvimento de atividade potencialmente poluidora, como sustentou o apelante, aplica-se a responsabilidade objetiva decorrente da Teoria do Risco Integral, prevista no artigo 225, parágrafo 3º, da Constituição Federal: "Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados."Imperativo reconhecer que tal posição constitucional recepciona o artigo 14, § 1º, da Lei 6.938/81, segundo o qual a responsabilidade dos causadores de danos ao meio ambiente é objetiva:"Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade". A respeito do tema, oportunas as ponderações tecidas pelo Desembargador Albino Jacomel Guérios, ao enfrentar demanda envolvendo acidente semelhante, quando do julgamento da apelação cível n. 772.999-5: "É que, em se tratando de dano ambiental, aplica- se à responsabilidade objetiva pelo dano ambiental a teoria do risco integral, conforme inteligência dos arts. 225, § 3º da CF c/c art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81. Isso significa que o agente poluidor é responsável pela reparação do dano causado independentemente de existir um fato culposo. Para o Direito Ambiental, são irrelevantes as circunstâncias do fato causador do dano. As excludentes do fato de terceiro, de culpa concorrente da vítima e do caso fortuito ou força maior não podem ser aceitas, de modo que, se o evento ocorreu no curso ou em razão de atividade potencialmente degradadora, incumbe ao responsável reparar eventuais danos causados, independentemente das circunstâncias justificadoras. É entendimento da doutrina:"No Brasil, e em muitos países, foi adotada, na área ambiental, a teoria da responsabilização objetiva, pelo risco criado e pela reparação integral. Entendem-se, por riscos criados, os produzidos por atividades e bens dos agentes que multiplicam, aumentam ou potencializam um dano ambiental. O risco criado tem lugar quando uma pessoa faz uso de mecanismos, instrumentos ou de meios que aumentam o perigo de dano. Nestas hipóteses, as pessoas que causaram dano respondem pela lesão praticada devido à criação de risco ou perigo, e não pela culpa. A reparação integral significa que o dano ambiental deve ser recomposto na sua integralidade, e não limitadamente, trazendo uma proteção mais efetiva ao bem ambiental. Benjamim diz que no direito brasileiro prevalece o princípio da reparabilidade integral do dano ao meio ambiente, por força de norma constitucional. Resultam deste princípio todas as formas de exclusão, modificação e limitação do reparo do dano ambiental. (...) Neste caso, o fundamento de sua responsabilidade civil não é a culpa, mas, sim, o risco, e sua obrigação não depende nem altera a existência de autorização, pois está alicerçado em uma exigência de justiça e eqüidade, o lesado não deve suportar um dano que, em sua origem, beneficia economicamente o agente. Neste sentido se manifestou Custódio: Naturalmente, com a teoria do risco, o juiz não mais examina o caráter lícito ou ilícito do ato reprovado, evidenciando-se que as questões de responsabilidade se transformam em simples problemas objetivos que se reduzem a simples verificação de um nexo de causalidade "1. Basta, por isso, provar o dano e o nexo de causalidade (...)." (sem destaque no original - TJPR. 10ª Câmara Cível. 10/06/2011) O dano ambiental discutido é fato público e notório, não havendo dúvidas de que a interdição da pesca, ocasionada pelo vazamento dos combustíveis (óleos e metanol) transportados pelo navio Vicuña, gerou, também, danos reflexos/individuais à parte apelante, 1 LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 128/130. porquanto se viu proibida de exercer sua profissão e prover o seu sustento e o de sua família. Circunstâncias que, por certo, causaram-lhe incerteza e insegurança com relação ao futuro de sua atividade. Até porque, embora a matéria ambiental genericamente seja coletiva latu sensu, o dano ambiental pode ser configurado individual ou pessoalmente. Esse dano ambiental individual é também chamado de dano reflexo ou dano ricochete, como explica Edis Milaré, na obra "Direito do Ambiente", Ed. Revista dos Tribunais, 2007, p. 813: "Essa é a modalidade de dano ambiental que, ao afetar desfavoravelmente a qualidade do meio, repercute de forma reflexa sobre as esferas de interesses patrimoniais ou extrapatrimoniais de outrem". Sobre a configuração do dano ambiental individual, também discorre José Rubens Morato Leite: "Com efeito, em vista do interesse individual próprio e do meio ambiente, a finalidade principal do interessado não tem por objetivo imediato a proteção do meio ambiente, que estará sendo tutelado, de forma indireta pela atitude do demandante, isto é, o interesse protegido, de forma direta, é a lesão ao patrimônio e demais valores das pessoas; e de forma mediata e incidental, o meio ambiente da coletividade, contribuindo para a sua proteção e para o exercício indireto da cidadania ambiental. Porém, mesmo em vista da proteção ao interesse individual próprio, poderá o demandante valer- se do aparato específico do meio ambiente e fundar o seu pedido em responsabilidade objetiva, na forma do citado art. 14, § 1º, da lei n. 6.938, de 1981 e do art. 927, parágrafo único, do Novo Código Civil, provando que a sua lesão pessoal foi oriunda de um ato de poluição, degradação ambiental ou risco provocado pelo demandado"("Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial" 2ª ed., São Paulo: RT, 2003, p. 138/139). Nas ações individuais, portanto, o interesse imediato é o de proteger particularmente a lesão ao patrimônio e demais interesses da pessoa. E de uma forma mediata, se defende o meio ambiente da coletividade, sua proteção e exercício da cidadania ambiental. Como visto, a responsabilidade objetiva, no presente caso, segue a teoria do risco integral, na qual a ocorrência de caso fortuito ou força maior não tem o condão de afastar o dever de indenizar. Esclarece a doutrina, inclusive, que: "A imputação independe de falta, e a conduta atacada pode ser lícita, pode estar atendendo aos padrões administrativos existentes, e pode até seguir as modernas técnicas para o setor ­ nada disso, por si, exime a responsabilidade pela deterioração nociva do meio ambiente" (CASTRO, Guilherme Couto de. "A Responsabilidade Civil Objetiva no Direito Brasileiro", Rio de Janeiro, Forense, 2005, p. 112). Acerca do tema, Caio Mário da Silva Pereira pondera com a mais absoluta propriedade: "Ante uma perda econômica, pergunta-se qual dos dois patrimônios deve responder, se o da vítima ou o do causador do prejuízo. E, na resposta à indagação, deve o direito inclinar-se em favor daquela, porque dos dois é quem não tem o poder de evitá-lo, enquanto o segundo estava em condições de retirar um proveito, sacar uma utilidade ou auferir um benefício da atividade que originou o prejuízo. O fundamento da teoria é mais humano do que o da culpa, e mais profundamente ligado ao sentimento de solidariedade social. Reparte, com maior dose de equidade, os efeitos dos danos sofridos, atendendo a que a vida em sociedade se tornou cada vez mais complexa e o progresso material a todo instante aumenta os riscos a que estão sujeitos os indivíduos. No campo objetivista situa-se a teoria do risco proclamando ser de melhor justiça que todo aquele que disponha de um conforto oferecido pelo progresso ou que realize um empreendimento portador de utilidade ou prazer, deve suportar os riscos a que exponha os outros." ("Instituições de Direito Civil", Vol. I, 16ª ed., ed. Forense, p. 422). Nelson Nery Júnior também tratou do assunto, afirmando a necessidade de interpretação teleológica dos dispositivos que envolvem a questão: "Essa interpretação é extraída do sentido teleológico da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, onde o legislador disse menos do que queria dizer ao estabelecer a responsabilidade objetiva. Segue-se daí que o poluidor deve assumir integralmente todos os riscos que advêm de sua atividade, como se isso fora um começo da socialização do risco e de prejuízo (...). Mas não é só a população que deve pagar esse alto preço pela chegada do progresso. O poluidor tem também a sua parcela de sacrifício, que é, justamente, a submissão à teoria do risco integral, subsistindo o dever de indenizar ainda quando o dano seja oriundo de caso fortuito ou força maior (Justitia, 126;174)"(em citação de Carlos Roberto Gonçalves in"Responsabilidade Civil", 9ª ed., 2006, p. 91) Esta posição, aliás, é adotada pelo Superior Tribunal de Justiça:"(...) O meio ambiente, ecologicamente equilibrado, é direito de todos, protegido pela própria Constituição Federal, cujo art. 225 o considera"bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida". (...) Além das medidas protetivas e preservativas previstas no § 1º, incs. I- VII do art. 225 da Constituição Federal, em seu § 3º ela trata da responsabilidade penal, administrativa e civil dos causadores de dano ao meio ambiente, ao dispor:"As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados". Neste ponto a Constituição recepcionou o já citado art. 14, § 1º da Lei n. 6.938/81, que estabeleceu responsabilidade objetiva para os causadores de dano ao meio ambiente, nos seguintes termos:"sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade."(grifos nossos) (Sergio Cavalieri Filho, in"Programa de Responsabilidade Civil")" (STJ, 1ª Turma, REsp 673.765 / RJ, Rel. Ministro Luiz Fux, julg. 19.05.2005). Mesmo em se tratando de responsabilidade objetiva fundada na Teoria do Risco Integral, portanto, a presença do dano, por si só, não enseja o dever de indenizar, cuja caracterização ­ em que pese não exija a demonstração de culpa e dolo, além de não admitir as causas excludentes de responsabilidade ­ pressupõe a existência de uma conduta lesiva imputada às apeladas, bem como do nexo de causalidade entre esta e a lesão experimentada. Em outras palavras, sendo desnecessária a prova de culpa ou dolo e inaplicáveis as excludentes de responsabilidade, basta ao édito condenatório a constatação do dano e do nexo de causalidade com a atividade do agente dito poluidor. Estes, indubitavelmente, devem se fazer presentes. Sobre a indispensabilidade do nexo de causalidade para a caracterização do dever de indenizar, oportuno citar o seguinte precedente desta Corte: "O nexo de causalidade é elemento indispensável em qualquer espécie de responsabilidade civil. Pode haver responsabilidade sem culpa como ocorre na responsabilidade objetiva, mas não pode haver responsabilidade sem nexo causal (...)."(TJPR - 8ª C.Cível - AC XXXXX-8 - Maringá - Rel.: Luis Espíndola - Unânime - J. 18.10.2007) Trilha no mesmo caminho, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, ao tratar especificamente do dano ambiental: PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL ­ AÇÃO CIVIL PÚBLICA ­ DANO AMBIENTAL ­ CONSTRUÇÃO DE HIDRELÉTRICA ­ RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA ­ ARTS. 3º, INC. IV, E 14, § 1º, DA LEI 6.398/1981 ­ IRRETROATIVIDADE DA LEI ­ PREQUESTIONAMENTO AUSENTE: SÚMULA 282/STF ­ PRESCRIÇÃO ­ DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO: SÚMULA 284/STF ­ INADMISSIBILIDADE. A responsabilidade por danos ambientais é objetiva e, como tal, não exige a comprovação de culpa, bastando a constatação do dano e do nexo de causalidade.(...) (STJ. REsp XXXXX/GO.Ministra Eliana Calmon. 2T. DJe 14/09/2009) PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. QUEIMADA. MULTA ADMINISTRATIVA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ART. 14, § 1º, DA LEI N. 6.398/1981. DANO AO MEIO AMBIENTE. NEXO CAUSAL. VERIFICAÇÃO. REEXAME DE PROVA. SÚMULA N. 7/STJ. A responsabilidade é objetiva; dispensa-se portanto a comprovação de culpa, entretanto há de se constatar o nexo causal entre a ação ou omissão e o dano causado, para configurar a responsabilidade.(...) ( AgRg no AREsp XXXXX / MT. Ministro Humberto Martins. 2T. DJe 22/06/2012) "A jurisprudência deste Sodalício orienta no sentido de que, em se tratando de dano ambiental, a responsabilidade é objetiva. Dispensa-se portanto a comprovação de culpa, entretanto há de se constatar o nexo causal entre a ação ou omissão e o dano causado, para configurar a responsabilidade" (STJ. AgRg no REsp XXXXX/SC. Rel. Ministro Mauro Campbell Marques. 2T. DJe 28/02/2013) "A responsabilidade civil objetiva por dano ambiental não exclui a comprovação da efetiva ocorrência de dano e do nexo de causalidade com a conduta do agente, pois estes são elementos essenciais ao reconhecimento do direito de reparação. Precedentes." (STJ. REsp XXXXX/SC. Rel. Ministra Eliana Calmon. 2T. DJe 14/10/2013) Imperioso, pois, tecer algumas considerações acerca do requisito da responsabilidade civil "nexo causal". Sobre o assunto, define Maria Helena Diniz: "O vínculo entre o prejuízo e a ação designa-se"nexo causal", de modo que o fato lesivo deverá ser oriundo da ação, diretamente ou como sua conseqüência previsível (...). Tal nexo representa, portanto, uma relação necessária entre o evento danoso e a ação que o produziu, de tal sorte que esta é considerada sua causa, (...), todavia não será necessário que o dano resulte apenas e imediatamente do fato que o produziu e bastará que se verifique que o dano não ocorreria se o fato não tivesse acontecido" . (in "Curso de Direito Civil Brasileiro": 7. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 127.) Ainda, consoante escólio de Sergio Cavalieri Filho, o liame de causalidade é o elemento de referência por meio do qual "poderemos concluir quem foi o causador do dano". (in Programa de responsabilidade civil. 5. ed. rev. aum. atual. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 66) Destaca-se, ademais, que na responsabilidade objetiva embasada na Teoria do Risco Integral, ocorrendo o dano ambiental, o liame de causalidade está estritamente ligado à atividade do poluidor. Ou seja, "ainda que haja autorização da autoridade competente, ainda que a emissão esteja dentro dos padrões estabelecidos pelas normas de segurança, ainda que a indústria tenha tomado todos os cuidados para evitar o dano, se ele ocorreu em virtude da atividade do poluidor, há o nexo causal que faz nascer o dever de indenizar" (sem destaque no original - Nelson Nery Júnior. Responsabilidade civil por dano ecológico e a ação civil pública. In Revista Justitia nº 126. São Paulo, julho/setembro, 1984, p. 175.) Igualmente esclarecedores, são os ensinamentos de Annelise Monteiro Steigleder: "o explorador da atividade econômica coloca-se na posição de garantidor da preservação ambiental e os danos que digam respeito à atividade estarão sempre vinculados a ela (...) Na teoria do risco integral, que se vale da teoria da equivalência das condições para aferição do liame causal, basta que o dano possa estar vinculado à existência do fator de risco, o qual é reputado causa do dano." (sem destaque no original - in Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 197) Partindo de tais premissas, "somente não haverá responsabilidade se: a) o risco não tiver sido criado; b) não houve dano; c) não houver relação de causalidade entre o ato gerador do risco e o dano"(sem destaque no original - Nicolao Costa Neto."Proteção jurídica do meio ambiente". Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 267.) E como preleciona Toshio Mukai, "somente empenha a responsabilidade de alguém por danos ambientais, se ficar comprovada a ação efetiva (atividade) desse alguém, direta ou indiretamente na causação do dano"("Responsabilidade civil objetiva por dano ambiental com base no risco criado." In: Fórum de direito urbano e ambiental ­ FDUA nº 4. Belo Horizonte: Editora Forum, julho/agosto, 2002, p. 336.) Desse modo, nos dizeres de Patrick de Araújo Ayala: "A responsabilidade do agente só será exonerada em se tratando da teoria do risco quando o risco não foi criado, o dano não existiu ou o dano não guarda relação de causalidade com aquele que criou o risco". (sem destaque no original - in Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial ­ teoria e prática. 4 ed. ver. Atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 201) Vê-se que a constatação do nexo de causalidade entre o resultado (dano ambiental ­ proibição da atividade pesqueira) e a conduta das apeladas (adquirentes da carga transportada no navio Vicuña, que vazou em decorrência de sua explosão) é indispensável para a caracterização do dever de indenizar. Vale rememorar que a causalidade amparada na teoria do risco integral é fundamentada na existência da atividade potencialmente poluidora de onde adveio o prejuízo. Ou seja, o dever de indenizar resulta do simples fato de existir o dano e de se desenvolver atividade de risco ao meio ambiente. Em observância à Teoria da Equivalência das Condições adotada no risco integral, basta para a existência do nexo causal um juízo de probabilidade de que o risco imposto pela atividade comum do agente tenha o condão de gerar o resultado. Noutro vértice, a Teoria do Risco Integral permite, também, a responsabilização solidária de todos aqueles que contribuíram para a ocorrência do dano, quando se estiver diante de múltiplos agentes potencialmente poluidores. Deve-se levar em consideração, entretanto, que a aplicação da teoria do risco integral ao dano ambiental objetiva, primordialmente, possibilitar a responsabilização dos agentes causadores de degradação ao meio ambiente, porque a imensa dificuldade em identificá- los poderia impedir a reparação do dano. Acima de tudo, utiliza-se da referida teoria a fim de viabilizar a reparação da lesão ambiental, em razão da hipossuficiência técnica, da menor disponibilidade de provas por parte da vítima e da penosa, senão impossível, identificação do agente poluidor. Empecilhos que em inúmeras situações seriam intransponíveis e inviabilizariam a indenização para a parte vulnerável. Decorre daí o fato de que, nos casos complicados/impossíveis de se estabelecer qual foi a atividade que efetivamente gerou o dano ambiental ou os fatores de risco que contribuíram para a sua ocorrência, responsabiliza-se todos os participantes da cadeia produtiva, como forma de evitar a impunidade. Busca-se, com isso, impedir que infratores ambientais se eximam de reparar os danos advindos do exercício de atividades lucrativas, em prejuízo da coletividade que teria que arcar com o ônus da degradação ao meio ambiente. Isso porque, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e saudável está diretamente ligado ao direito à vida, tratando-se de direito fundamental coletivo e de interesse difuso. Individualizados, entretanto, aqueles que exercem as atividades geradoras dos riscos que culminaram com o dano ambiental, a eles se restringe o dever de reparação. Feitas tais considerações e trazendo-as para o caso concreto, tem-se que não assiste razão à parte apelante ao se insurgir contra a sentença, pois, de fato, inexiste o nexo de causalidade entre a conduta das apeladas e o dano moral sofrido. Isso porque, o inquérito administrativo instaurado pela Capitania dos Portos do Paraná para apurar as causas do acidente logrou êxito em identificar os agentes poluidores a quem são imputados os fatores de risco que levaram ao dano ambiental (Teoria da Equivalência das Condições). Segundo o resultado dos exames periciais produzidos no referido inquérito, a causa mais provável para a ocorrência do acidente foi que a bomba de descarga do navio, "em condições anormais, poderia gerar uma faísca através do contato de duas partes metálicas ou, então, a geração de calor em função do atrito entre os componentes da bomba. (...) A bomba do tanque CS7, no qual se estima tenha iniciado o processo que culminou com a explosão do navio, estava operando no momento do acidente. (...) As bombas periciadas não estavam em bom estado de conservação, face aos indícios surgidos durante a desmontagem dessas. Os rotores das bombas apresentavam forte corrosão intergranular, com várias partes de sua superfície preenchidas com solda e desgastes generalizados em várias partes." (fl. 195/196) Constatou-se, igualmente, falha no procedimento de operação por parte do terminal, o que também poderia levar ao sinistro, sendo observada uma das válvulas de esfera sem a metade dos parafusos de conexão do mangote. Os peritos, inclusive, estabeleceram e pontuaram às fls. 216/217 os fatores de risco que podem ter levado à explosão, atribuindo- os ao terminal da Cattalini e ao navio Vicunã: "Tanto o terminal da Cattalini quanto o NM Vicuña apresentavam irregularidades (...) consideradas sérias e capazes de provocar um acidente de vulto. Não foi possível estabelecer com certeza o responsável pela explosão seguida de incêndio do NT Vicuña, mas ressalta-se a responsabilidade pelo risco que gerou, conforme o artigo 15, alínea e da Lei 2180/54."(sem destaque no original) Além do mais, concluiu o inquérito que"são possíveis responsáveis diretos pelo acidente a SOCIEDADE NAVIERA ULTRAGÁS e o TERMINAL CATALLINI." (fl. 218), respectivamente, a empresa responsável pelo transporte dos combustíveis (óleos e metanol) derramados nas águas da região de Paranaguá e a empresa responsável pelo terminal onde se operava o descarregamento da mercadoria. Não se vislumbra, portanto, qualquer fator de risco imputável às apeladas que poderia ter sido a causa do nefasto acidente. O fato de serem as adquirentes da mercadoria transportada pela embarcação em nada contribuiu para a explosão do navio Vicuña. As apeladas sequer podem ser consideradas proprietárias da carga, na medida em que esta, tendo perecido no momento do sinistro, nunca lhes foi entregue. Além o fato de a modalidade do frete contratado para o transporte da mercadoria importada pelas apeladas ser adstrita ao "grupo C" dos termos internacionais de comércio (INCOTERMS) e não ao "grupo F" corrobora a conclusão de não ter se operado a tradição da carga, que permaneceu sob a responsabilidade do vendedor. Some-se a isso que as apeladas são empresas de fabricação e comercialização de produtos químicos e não transportadoras ou responsáveis pelo terminal de operação de desembarque da carga. O acidente em análise, por sua vez, está diretamente ligado aos riscos próprios das atividades destas últimas. Poder-se-ia responsabilizar as apeladas pelo dano ambiental, caso o sinistro estivesse ligado aos riscos próprios de suas atividades, quais sejam, os decorrentes da manipulação ou armazenamento de produtos químicos poluentes. O risco inerente à atividade de transporte do produto adquirido, portanto, não lhes pode ser transferido, haja vista que não se constatou qualquer conduta arriscada destas, passível de ser considerada possível fator determinante do acidente. Deve-se ter em mente, pois, que dentre as atividades habituais das apeladas não estão incluídas aquelas consideradas fatores de risco para a explosão do navio Vicuña. O mesmo, contudo, não se pode afirmar com relação às empresas Naviera Ultragás e Cattalini, porquanto, por serem, respectivamente, a proprietária do navio que transportava a carga e a proprietária do terminal marítimo onde se operava o seu desembarque, o risco do dano causado pelo sinistro é inerente às próprias atividades que exercem. Os lucros das citadas empresas advêm da exploração de atividades potencialmente lesivas ao ambiente, identificadas como produtoras dos fatores de risco que podem ter causado a explosão do navio Vicuña e a consequente poluição ambiental. Ora, a teor do disposto no artigo , inciso IV, da Lei n. 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos, poluidor é justamente a "pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental." Dessa feita, como não há conduta das apeladas, nem direta nem indireta, que se vincule ao dano, obrigatório o reconhecimento da ausência do nexo de causalidade, principalmente porque os possíveis causadores das lesões foram devidamente identificados, por meio do inquérito instaurado pela Capitania dos Portos do Estado do Paraná. Observa-se que "o nexo causal se torna assim 'indispensável' para que a culpa aquiliana possa gerar conseqüências para seu autor. Não basta que um dano tenha coincidido com a existência de uma culpa ou de um risco para estabelecer uma responsabilidade. Coincidência não implica em causalidade." (Caio Mário da Silva, 'Responsabilidade Civil', 2ª ed, Forense, fls. 83) Nesse sentido, já se pronunciou este Tribunal: "APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE AMBIENTAL. PRELIMINAR. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. CABIMENTO. DECLARAÇÃO DE POBREZA. INEXISTÊNCIA DE PROVA EM CONTRÁRIO. LITISCONSÓRCIO ATIVO. IRRELEVÂNCIA. DENUNCIAÇÃO À LIDE DA SEGURADORA. IMPOSSIBILIDADE. ILEGITIMIDADE ATIVA. DESCABIMENTO. CONDIÇÃO DE PESCADORES DEMONSTRADA. MÉRITO. ACORDO CELEBRADO E HOMOLOGADO ENTRE OS AUTORES E O TERMINAL MARÍTIMO ONDE OCORREU O SINISTRO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO EM RELAÇÃO AS APELADAS. EXTENSÃO DOS EFEITOS DA TRANSAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. QUITAÇÃO PARCIAL DA DÍVIDA. APLICAÇÃO DO ARTIGO 515, § 3º DO CPC. POSSIBILIDADE. REQUERIDAS QUE APENAS ADQUIRIRAM A CARGA DERRAMADA. INEXISTÊNCIA DE TRADIÇÃO DA COISA. NEXO CAUSAL NÃO DEMONSTRADO. RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO DO NAVIO ASSIM COMO DO TERMINAL MARÍTIMO. IMPERIOSA IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. RECURSO DE APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDO E RECURSO ADESIVO DESPROVIDO". (TJPR AC XXXXX-4 10ª C.Cível Rel. Des. Arquelau Araújo Ribas J.07/07/20011) Apelação cível. Ação de indenização. Acidente ambiental.Explosão do Navio Vicuña. Vazamento de óleo. Preliminar.Assistência judiciária gratuita. Declaração de pobreza.Litisconsórcio ativo. Irrelevância. Benefício mantido.Denunciação da lide da seguradora. Desnecessidade.Legitimidade ativa. Demonstração suficiente. Acordo celebrado entre os pescadores, o proprietário do navio e o terminal marítimo. Demanda proposta em face das proprietárias da carga. Extinção do feito, sem análise de mérito, por falta de interesse de agir. Reforma. Quitação parcial da dívida. Julgamento pelo art. 515, § 3º, do CPC. Rés que apenas adquiriram a carga. Ausência de tradição da coisa. Falta de nexo causal entre a compra da carga e os danos causados. Responsabilidade do proprietário do navio e do terminal marítimo. Improcedência.Recurso de apelação provido parcialmente.Recurso adesivo desprovido.1. Justiça Gratuita. A existência de litisconsórcio ativo, composto por dez autores, permitindo eventual rateio das custas, não significa que estes possam arcar com o pagamento destas, posto terem declarado se tratarem de pobres na acepção jurídica do termo, em obediência ao art. , da Lei 1060/50, fazendo jus ao benefício, tanto mais porque ausente prova em sentido contrário. 2. Denunciação da lide. Mantida a sentença improcedência, torna-se desnecessária a denunciação a lide da seguradora de uma das rés, ora recorrente adesiva, pois ausente condenação a ser reembolsada pela seguradora.3. Legitimidade ativa. As carteiras profissionais apresentadas são provas hábeis a demonstrar a condição de pescadores.4. Transação parcial. Há interesse de agir dos autores, merecendo reforma a sentença neste ponto, uma vez que a transação realizada entre os pescadores e proprietária do navio e, após, com o terminal marítimo, quitou parcialmente a dívida, devendo os demais responsáveis pelo evento arcar com o restante da obrigação.Provimento adstrito a este aspecto.5. Julgamento pelo art. 515, § 3º, do CPC. As empresas-rés não são poluidoras, nem mesmo por equiparação, pois somente adquiriram a carga sem recebê-la, uma vez que a explosão do navio ocorreu no terminal marítimo, antes da tradição da coisa. (TJPR - 10ª C.Cível - AC - 942803-9 - Paranaguá - Rel.: Hélio Henrique Lopes Fernandes Lima - Unânime - - J. 18.10.2012) Do corpo do último acórdão, pela propriedade com que enfrentou a questão, vale transcrever: "Na hipótese, as empresas rés-apeladas não são poluidoras, nem mesmo por equiparação, pois somente adquiriram a carga que não chegou a lhes ser entregue, uma vez que a explosão do navio ocorreu ainda no terminal marítimo, antes da tradição da coisa. (...) O ato de adquirir determinado produto, por si, não caracteriza o nexo de causalidade com o dano reclamado, uma vez que, a mera aquisição, sem a tradição da coisa adquirida, não é a causa dos prejuízos. Os prejuízos foram causados pela explosão do navio, sem guardar relação com a compra do produto por ele transportado." Consequentemente, não preenchidos, no caso concreto, os requisitos autorizadores da responsabilidade civil, eis que ausente o nexo de causalidade, a improcedência do pedido é medida que se impõe. Diante de todo o exposto, nega-se provimento ao recurso, mantendo-se incólume a sentença. ACORDAM os Desembargadores que integram a Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto. O julgamento foi presidido pelo Senhor Desembargador Luiz Osorio Moraes Panza, com voto, e dele participou o Senhor Desembargador José Augusto Gomes Aniceto. Curitiba, 05 de março de 2015. ASSINADO DIGITALMENTE Desembargador Domingos José Perfetto Relator
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-pr/176674050

Informações relacionadas

Tribunal de Justiça do Paraná
Jurisprudênciahá 2 anos

Tribunal de Justiça do Paraná TJ-PR - Apelação: APL XXXXX-21.2017.8.16.0069 Cianorte XXXXX-21.2017.8.16.0069 (Acórdão)

Tribunal de Justiça do Paraná
Jurisprudênciahá 17 anos

Tribunal de Justiça do Paraná TJ-PR - Apelação Cível: AC XXXXX PR XXXXX-8

Tribunal de Justiça do Paraná
Jurisprudênciahá 2 anos

Tribunal de Justiça do Paraná TJ-PR - Apelação: APL XXXXX-41.2005.8.16.0129 Paranaguá XXXXX-41.2005.8.16.0129 (Acórdão)

Superior Tribunal de Justiça STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp XXXXX PR XXXX/XXXXX-7

Superior Tribunal de Justiça STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp XXXXX PR XXXX/XXXXX-6